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Globalização da ciranda financeira


15/09/2021



Artigo escrito pelo empresário Antonio Ermírio de Moraes e publicado no Jornal Folha de São Paulo em 22.10.1995.

 Globalização é a palavra da moda. A produção industrial se torna cada vez mais global. Um simples tênis é composto de 10, 11, 12 partes, por sua vez produzidas em várias partes do planeta e montadas em outra. O comércio também se globaliza na medida em que as vendas são realizadas em todas as esquinas do mundo e através de catálogos e computadores.

Há pouco mais de um mês a Microsoft lançou um programa de computador em todos os países, no mesmo dia e, se não fossem as diferenças de fuso, na mesma hora. Esse processo avança com uma velocidade incrível e de forma inexorável. O diretor-geral do FMI, porém, teve a coragem de chamar a atenção para um perigosíssimo tipo de globalização: a globalização dos mercados financeiros.

Com o avanço das telecomunicações e com a queda das proteções nacionais o dinheiro passou a circular com uma facilidade enorme. Por meio das telecomunicações, quase US$ 2 trilhões (!) são transferidos diariamente de um lado para o outro e em busca dos melhores rendimentos. Estudo recente mostrou que uma diferença de dez segundos permitiu um ganho de US$ 600 milhões em uma aplicação de um dia nos chamados "mercados emergentes" (Hoekman e Sauvé, Information Technology and Transformation of Financial Markets, 1991).

Tudo isso seria bonito se não fosse artificial. A informática está transformando o mundo em um ilusório cassino. Os riscos de um grande desastre crescem de hora em hora. O perigo é bilateral, afetando tanto quem aplica quanto quem recebe o dinheiro. Veja o caso do Brasil. Um bom número de brasileiros descobriu que o grande negócio do momento é mandar dinheiro de dentro para fora (para ter segurança) e reaplicá-lo de fora para dentro (para ter rentabilidade). E os demais brasileiros pagam a conta...

É claro que um jogo desse tipo é falso, insustentável e explosivo. É apenas questão de tempo. Algum dia a casa cai. Nesse momento rolarão os que aplicaram e os que receberam as aplicações. Esse é o perigo apontado pelo diretor do FMI. Entretanto, há um outro perigo (ainda mais grave) que ele deixou de apontar. O fato é que, enquanto a profetizada explosão não chega, os grandes prejudicados são os que vivem do trabalho nos tais mercados emergentes. Eles é que estão bancando os juros que são auferidos pelos especuladores.

Pensando bem, essa sangria é mais devastadora do que o eventual estouro dos mercados, pois ela é contínua, crescente, corrosiva, debilitante e fatal. Sim, fatal para quem trabalha e produz. Ou seja, a ciranda financeira, que foi uma criação da imaginativa engenharia financeira nacional, acaba de se globalizar, ficando à disposição - de forma escancarada - de todos os especuladores do mundo, inclusive os brasileiros. E nós, trouxas, assistimos a esse triste espetáculo sem poder agir. Pagando por um ingresso caro e sem ter o direito de desfrutar do mesmo. Triste destino.



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