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DÁ PARA INTEGRAR NOSSOS LARES AO PROCESSO EDUCACIONAL?

Newton M. Campos
13/12/2012



Semana passada fui ao cinema assistir ao excelente filme Norte-Americano Desapego (Detachment). Fazia tempo que queria vê-lo. Trata-se da história de um professor de educação secundária, enviado a escolas públicas da periferia para repor aulas de inglês.

Sem entrar no drama das histórias contadas, a primeira coisa que me chamou a atenção foi, mais uma vez, perceber que mesmo a escola pública mais “feia, pobre e sem infraestrutura” dos Estados Unidos, é incrivelmente bonita e bem cuidada para os padrões da maioria das economias subdesenvolvidas ou em desenvolvimento do mundo (Brasil incluído).

O filme nos deixa uma mensagem aparentemente básica, mas muito relevante: que a informação vem da escola (ou mesmo da internet, hoje em dia), mas educação vem de casa (e nunca da internet).

É a falta de exposição a valores humanos e a referências inspiradoras no lar que contaminam o ambiente educacional de muitas escolas pelo mundo na atualidade. E tampouco se trata de uma questão de pobreza ou riqueza: essa “falta de educação” moderna está presente também em muitas escolas de elite, seja nos Estados Unidos, na Espanha ou no Brasil. Falta educação em casa.

Fiquei pensando numa das características da educação do futuro: maior integração de atores ao sistema educacional. Por exemplo, a partir do ano que vem, num projeto pioneiro que lidero aqui em minha universidade, os programas de mestrado integrarão alunos e ex-alunos da escola num mesmo grupo, utilizando, simultaneamente a formação tradicional e a educação continuada. Utilizaremos o formato blended (semipresencial). O resultado? Acreditamos que isso resultará numa experiência muito mais enriquecedora para professores, alunos e ex-alunos, que poderão aprender todos uns dos outros.

No futuro não muito distante, conseguiremos integrar também ex-alunos de outras universidades, professores de outras universidades, profissionais do mercado (guest speakers) e quem sabe até mesmo amigos, colegas de trabalho e parentes destes profissionais às mesmas plataformas de formação (desde que cumpram obviamente com os rigorosos processos de seleção).

Se isso for bem administrado, todos aprenderão de todos, numa riqueza de intercâmbios absolutamente inédita para um programa formal de mestrado (só receberiam diplomas oficiais os alunos matriculados, os demais participantes receberiam certificados não-oficiais).

Porque não podemos, da mesma forma e num futuro relativamente próximo, integrar nossos lares aos sistemas educacionais públicos e privados de nossos filhos, amigos e colegas de trabalho, com a ajuda da tecnologia? Assim poderíamos tentar fazer que todo um bairro se envolva, de forma presencial e a distância, no processo de ensino e aprendizagem coletivo.


Uma ficção americana, um estado humano e uma realidade brasileira –  por Juliana Fernandez

Uma escola em estado de caos, professores que não possuem vozes e alunos fazendo o que querem por não saberem o que querer. Tudo parece perdido até a chegada de um professor substituto. Familiar, não?

Não é de hoje que são feitos filmes sobre ensino, relação professor-aluno e – é claro – estudantes. Sempre com carga dramática reforçada, eles tentam no auge de seu mundo fictício mostrar os ‘adolescentes de agora’ e seus problemas, com uma bela mensagem de superação no final.

Detachment (cujo nome em terras tupiniquins é Desapego, e se fosse nomeado Indiferença faria muito mais sentido) preenche quase todos os requisitos.

Quase.

A história se passa em uma escola pública nova-iorquina, na qual Henry Barthes (Adrien Brody) acaba de começar sua estadia como professor substituto. Logo de cara, percebemos que onde deveria ser um lugar de iluminação acadêmica é, na verdade, um lugar de caos. Adolescentes sem limites e propósitos impõem vontades aos professores que desistiram de ensinar há muito tempo. Em sua primeira aula, Barthes já mostra porque é ‘o melhor substituto da lista’: os alunos, ainda que não espontaneamente, passam a respeitá-lo, o que se mostrou impossível para muitos dos professores permanentes. Atormentado por demônios do passado, a vida do professor sofre uma reviravolta a partir do momento que Erica (Sami Gayle) – uma prostituta adolescente –, começa a fazer parte dela.

O filme, lançado em 2011, foi vencedor do Prêmio do Público de melhor ficção internacional da 35ª Mostra de Cinema de São Paulo e, assim como muitos dos filmes que vão para festivais, não foi levado ao expectador ‘comum’. Dirigido por Tony Kaye (que faz as excentricidades de Tim Burton parecerem mesquinharia), o filme trata de um assunto tão explorado quanto esquecido: a indiferença.

Barthes é um ótimo professor, um daqueles que possuem uma bela mensagem no final. Entretanto, ele nunca fica tempo o suficiente em um colégio para criar raízes e transformar a vida dos seus alunos. E talvez isso sugira desapego, mas é muito mais profundo. Ele é indiferente a ele mesmo.

E isso não é novidade. Nós sabemos o que é isso, alguns de nós sabe o que é sentir isso. Existem livros sobre o assunto, ele aparece em filmes e no Globo Repórter. Todavia, se tornou tão comum e tão banal. Nós nos tornamos indiferentes à depressão, melancolia, dor… Dos outros e nossas, e talvez seja essa a mensagem que Kaye quer passar, mas eu posso estar errada.

Todavia, Detachment pode ser apenas sobre o ensino publico americano, pois isso não tiraria seu mérito.

Ao escolher escrever sobre o longa-metragem, não compreendia muito bem o que estava indo assistir. Adquirido de maneira ilícita há certo tempo, eu havia comentado sobre o longa-metragem com um amigo, que o colocou naquela classe de filmes que foram ‘para Oscar’ e que por tal motivo, não iria assisti-lo. Por pura birra, decidi assistir mesmo assim, meu ‘sexto sentido’ me dizia que o filme era bom.

É mordendo a língua que digo – ou escrevo – que não, meu amigo não está errado. Mas quer saber? Meus sentidos – reais ou fictícios – não erraram também.

O elenco é ótimo e sabe o que precisa fazer: Marcia Gay Harden, James Caan, Lucy Liu, Christina Hendricks… As novinhas Samy Gayle e Betty Kaye (filha do diretor) estão espantosas, mas quem ainda rouba a cena é Adrien Brody.

O filme é sobre Henry Barthes. O filme é dele.

Todas as emoções que Barthes poderia sentir, Brody as transmitiu. Sua atuação é tão visceral que sua personagem não parece real ao expectador, vai muito além, o expectador a sente real.

Kaye pai também é responsável pela fotografia do filme, que de tão linda só peca por usar de tudo um pouco e deixar o filme um tanto poluído. A trilha sonora composta pelos irmãos Newton deixam tudo mais triste e angustiante, e pela proposta do longa-metragem, pode-se dizer que tiveram sucesso em sua façanha.

Entretanto, meu amigo não estava errado e Detachment foi milimetricamente construído para um Oscar. Os conflitos, entrecortados por passagens de livros e frases marcantes, servidos com uma boa dose de pessimismo como um acompanhamento profundo e impactante, são propositais demais para sentir natural. Alguns professores criticaram a obra de Kaye por deixar tudo muito mais dramático do que a realidade de uma escola americana, traindo ai o tom de “quase-um-documentário” do filme. O roteirista Carl Lund era professor e o longa-metragem é parte de suas memórias enquanto professor substituto, o que fez com que ele colocasse acontecimentos de anos nos três meses apresentados no filme.

Ele também pode ter sido substituto de um professor em uma escola americana tão ruim que lembra muito várias escolas publicas de nosso país. Porque mesmo se passando nos Estados Unidos, os conflitos do longa-metragem são bem brasileiros.

Sem as glorias pretendidas, Detachment é um filme que pode não fazer lágrimas caírem sem parar, mas tem a força suficiente de um tapa na cara. Os brasileiros que tiveram a oportunidade de vê-lo não são os mesmos que vivem a realidade do longa-metragem, e talvez por causa disso ele possa parecer mais fictício do que realmente é.

Você pode ser indiferente ao papel do professor na sociedade, à greve de três meses das universidades publicas e à juventude atual. Mas acredite em mim, se você der uma oportunidade a Detachment, você não será indiferente a ele.

Fonte: Estadão



Newton Campos – Com experiência nas áreas de tecnologia e educação superior, participou de numerosos projetos em distintos países. Atualmente leciona e trabalha na IE Business School da Espanha, com profissionais que criaram alguns dos melhores programas de pós-graduação em formato blended do mundo. É também professor da FGV-SP. Doutor em Criação e Gestão de Negócios pela FGV-SP, passou por organizações como PricewaterhouseCoopers, Telefónica e IIM Indian Institute of Management, além de ter participado na criação de diversas empresas no Brasil entre 1997 e 2010. É colaborador do Blog Educação do Jornal O Estado de S.Paulo.
Comentários:


Fernando comentou em 14/12/2012 - 14:12:15

Interessante, tambem pretendo ver esse filme. A educacao Waldorf e' um esforco antigo nesse sentido. Surgiu na alemanha em 1919 mas ate' no Brasil exite esse metodo de ensini que e'holistico fazem 25 anos, com resultados surpreendentemente bons.



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