Para que os avanços tecnológicos produzam melhorias gerais efetivas na qualidade de vida, eles precisam ser acompanhados no avanço do desenvolvimento humano. O ser humano desenvolvido estará consciente das mudanças, saberá das causas e efeitos, estará apto para se adaptar naturalmente às mudanças, tudo dentro de um proposito de melhoria geral das condições de vida.
O atual modelo de educação não atende às exigências do mundo do trabalho na era tecnológica, disse nesta quarta-feira, 20, o professor Jim Lengel, da Universidade de Nova York, ao participar de evento sobre gestão educacional na capital paulista. "A educação não mudou para atender às necessidades do mundo a sua volta. O ambiente do trabalho de hoje demanda que se trabalhe em pequenos grupos para solucionar problemas, precisa de ferramentas digitais e que as pessoas estejam preparadas para desempenhar multitarefas sem a supervisão de outros. A maior parte das nossas escolas não estão fazendo isso", ressaltou.
Lengel é formulador do conceito Educação 3.0, que relaciona as mudanças históricas ocorridas no modelo educacional para que ele tivesse correspondência com as demandas profissionais. "Há 150 anos, as pessoas trabalhavam na terra, com as mãos, com ferramentas e em grupos pequenos. O trabalho não mudou muito de geração a geração. As pessoas ensinavam uns aos outros conforme trabalhavam", disse ao explicar o Ambiente de Trabalho 1.0.
O professor destaca que as escolas daquela época ensinavam em pequenos grupos, com ferramentas manuais, com uma clara visão do mundo externo e com faixas etárias diversas em uma mesma sala. "Educação e local de trabalho combinavam perfeitamente. A escola produzia os cidadãos necessários ao mundo naquele momento", explicou.
No início do século 20, de acordo com Lengel, o trabalho mudou e, com ele, a educação. "As pessoas migraram para as cidades, utilizavam ferramentas mecânicas, trabalhavam solitariamente, em salas enormes e lotadas. Todos faziam a mesma coisa, na mesma hora, o dia inteiro. Não podiam conversar e eram fiscalizados", disse. Na avaliação do professor, as escolas mudaram para atender às necessidades dessa nova economia industrial. "Grandes grupos, com a mesma idade, alunos fechados na sala, trabalhando todos da mesma forma, utilizando ferramentas mecânicas como papel e lápis", completou.
Embora o mundo do trabalho tenha mudado com o uso das novas tecnologias, Lengel ressalta que o modelo educacional adotado ainda corresponde ao do início do processo de industrialização. "Enquanto o Ambiente de Trabalho 3.0 exige pessoas que saibam lidar com multitarefas, com o uso de ferramentas digitais, que estejam conectadas com o mundo exterior, o ambiente educacional continua com um modelo que corresponde ao Ambiente 2.0", explicou.
O professor destaca que as soluções exigidas aos profissionais da atualidade têm diferentes fontes. "Ele precisa lidar com problemas que ninguém tinha lidado antes. E para isso, tem que coordenar diferentes disciplinas, como física, matemática, literatura. Esse é o ambiente de trabalho nos dias de hoje. Essas informações vêm de muitas fontes e, na maioria das vezes, são buscadas na rede [internet]. Essa é a sociedade que construímos nos últimos 50 anos", apontou.
Lengel destaca que avaliação dos alunos nesse modelo não suporta a utilização de métodos tradicionais, como provas "com lápis e papel". "Para avaliar esse tipo de aprendizado, é preciso testá-los no mundo real, de forma a perceber se o aluno tem habilidades e competências para ser um bom profissional e cidadão. Essa é a melhor forma de fazer a avaliação", propõe.
A pedagoga Isolda Ducat, assessora pedagógica do Colégio Imperatriz Dona Leopoldina, em Guarapuava (PR), destaca, entre as dificuldades para adotar metodologias adequadas à era tecnológica, o fato de que os professores foram formados no modelo 2.0. "A própria formação dos professores foi mais fragmentada, às vezes, até um pouco descontextualizada. Isso dificulta a adesão deles a esse processo. O professor está também ensaiando essa nova proposta", disse.
Para Lengel, é fundamental que os educadores conheçam e usem as ferramentas tecnológicas incorporadas pelos alunos. "O professor não pode se sentir ameaçado pelo tablet. Até mesmo o Facebook pode ser usado como um meio de aprendizagem. Ele precisa incorporar esses conhecimentos", recomendou. Segundo ele, o uso da internet em sala de aula faz com que o estudante reúna dados complementares e mantenha contato com pessoas interessadas no mesmo assunto.
Vera Lúcia Stivaletti, pró-reitora da Universidade Metodista de São Paulo, acredita que a mudança de postura dos educadores e alunos é o principal entrave para mudanças no modelo educacional. "Os princípios da integração, da interdisciplinaridade, da flexibilização são princípios que devem estar bem presentes, mas que não são fáceis de serem trabalhados", declarou.
Fonte:
Estadão