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A MISSAO DE EDUCAR

Benedicto Ismael C. Dutra
19/07/2010



O educador Elzio D’Arienzo, escreveu em seu livro “A missão de educar”, Editora Scortecci: “Um problema que parece não ter solução neste País é o da qualidade da educação básica ministrada na escola pública. Como justificar os péssimos resultados que avaliações nacionais e internacionais vêm revelando ao longo de muitos anos? Falhas, perdas, acidentes, baixo rendimento, e que acontecem em qualquer trabalho são indicações claras de que o processo usado precisa ser substituído ou modificado. É o procedimento normal em qualquer atividade, e no caso da educação básica ministrada na escola pública, já deveria ter sido aplicado há muito tempo porque diz respeito ao direito que, não sendo atendido em época apropriada, provoca consequencias irreparáveis ao educando”.
 
Conforme D’Arienzo constatou em suas observações a educação de qualidade depende de um conjunto de ações destacado a importância da Educação infantil a partir da gestação.
 
Apreciando melhorias relacionadas ao ensino fundamental, Vanda Engel, doutora em educação pela PUC-Rio, em seu artigo ''Afinal, o que é priorizar a educação?", afirma: ''Apesar destes avanços, nossos grandes calcanhares-de-aquiles continuam sendo a educação infantil e o ensino médio. Ainda não nos conscientizamos que uma criança não nasce aos 6 anos de idade e de que a primeira infância é o período mais importante na formação dos seres humanos." Sobre o mesmo assunto, o editorial "Outro triste retrato do ensino” diz: ''Além do ensino fundamental, o levantamento da Unesco enfatiza a importância da educação infantil. O relatório sugere ao País ampliar os investimentos em creches e pré-escolas, como principal estratégia para elevar o aproveitamento dos alunos no ensino fundamental, especialmente os de famílias de baixa renda". Diz ainda: "Conforme afirma a educadora gaúcha Alessandra Schneider, Coordenadora do Escritório da Unesco no Rio Grande do Sul, é na faixa etária de 0 a 3 anos que se forma 90% das conexões cerebrais."
 
Prosseguindo, diz: "De fato, as pesquisas científicas há muito tempo destacam a importância da educação infantil no desenvolvimento físico, cognitivo, afetivo e social das crianças. Algumas dessas pesquisas comprovando que quanto mais cedo a criança ingressa no sistema educacional maior é o aproveitamento escolar e melhor sua conduta social, renderam o Prêmio Nobel de 2000 ao economista americano James Heckman, da Universidade de Chicago. Seus estudos revelam que as crianças que estiveram em creches e cursaram a pré-escola tendem a obter maior sucesso profissional em comparação com as que foram matriculados no ensino fundamental sem passar pelo ensino infantil."
 
Acrescenta ainda: "Em nota divulgada após a publicação do levantamento da Unesco, o Ministério da Educação (MEC) afirmou que o atendimento em creches subiu de 10% para 13,45% das crianças com até 3 anos, entre 2001 e 2004, e que na pré-escola o aumento foi de 65,6% para 70,5% da população de 4 a 6 anos, no mesmo período. É um avanço importante, não há dúvida. Mas ele poderia ser mais expressivo se o governo, em vez de desperdiçar recursos escassos com projetos de reforma universitária, política de cotas raciais e outras iniciativas demagógicas no âmbito do ensino superior, tivesse dado prioridade à educação infantil e fundamental, a exemplo do que faz a Coréia do Sul."
 
A pesquisa de James Heckman conduziu a importante revelação de que a educação infantil gera efeitos benéficos não só durante a permanência da criança na creche. Tem desdobramento que alcança os ciclos seguintes de estudo e se estende à vida profissional e à conduta social. Em outras palavras, o comportamento da criança na vida adulta será orientado por um leque de situações saudáveis voltadas para os valores éticos, morais e religiosos que vão contribuir para a formação de famílias estruturadas ao abrigo de padrões que respondem pelo adiantamento de um povo, principalmente quando nos lares se pratica a importante função de atuar como primeira escola da vida.
 
Informando pequena elevação ocorrida no atendimento da creche e pré-escola em quatro anos, o MEC demonstra que seu despreparo para o ensino fundamental e médio se estende também à educação infantil. Em outros países a premiação a James Heckman deve ter contribuído para melhorar as políticas educacionais desse ciclo de formação da criança. No Brasil, a lacônica nota é reveladora da reduzida participação do MEC na educação infantil.
 
Até aqui falamos da idade zero em diante, isto é, a partir do nascimento da criança. Mas pesquisas não menos importantes que a acima mencionada tratam do período pré-natal que pode ser divido em três etapas: implantação da célula embrionária, fase embrionária e fase fetal, Em rápidas palavras, presume-se que entre três a quatro dias o óvulo atravessa a trompa e no sexto dia depois da fecundação "fixa-se" na mucosa uterina, iniciando a fase de implantação. Durante o segundo mês de gestação, o embrião atinge cerca de 25 mm e as partes da cabeça e do tronco podem ser facilmente reconhecidas. A partir do terceiro mês, o embrião, que agora se chama feto, inicia alguns movimentos respiratórios, apesar de estar imerso em líquido amniótico.
 
No quarto mês o feto tem aumentado seu peso em aproximadamente seis vezes, passa de 20 para 120 gramas. Durante o quinto e sexto mês de gestação inicia-se o crescimento do cabelo, cílios e supercílios. Os movimentos realizados pelo feto são perfeitamente percebidos pela mãe. O feto ganha muito peso durante os últimos dois meses de gestação e decorridos nove meses depois da fecundação a criança está prontinha para nascer. Toda mãe sonha em ter filhos saudáveis, mas para as que pertencem aos segmentos menos favorecidos esse sonho pode não se realizar.
 
Além de minguados recursos com que vivem, pesa também o fato de não serem alfabetizadas ou serem analfabetas funcionais e não raras vezes, desiludidas, se viciam no tabagismo, alcoolismo ou no consumo de drogas, situação esta que pode estar associada à gravidez precoce, em grande parte provocada pela baixa escolaridade.
 
Considere-se ainda que durante os meses que antecedem o parto a mulher deve ser orientada principalmente sobre o seguinte: exames que deve fazer e a razão dos mesmos; fatores de riscos numa gravidez; a que sinais deve estar atenta durante esse período; higiene a ser observada; cuidados com a saúde oral e com a alimentação; alimentos recomendados e alimentos que deve evitar; exercícios físicos que deve praticar; não se automedicar; danos à saúde do bebê que podem ser provocados pelo hábito de fumar, consumir drogas e álcool. Para as mulheres que não sabem ler nem escrever, simples e apressadas orientações não são suficientes. É imprescindível um acompanhamento sistemático que complemente a orientação, verificando se as instruções estão sendo observadas e se a gestação decorre em condições satisfatórias para a mãe e para o bebê.
 
Compõem a educação básica: os ensinos infantil, fundamental e médio e, de acordo com a Constituição, o primeiro é responsabilidade exclusiva dos municípios e o último dos estados, sendo o ensino fundamental compartilhado entre duas estâncias de governo, esclarece Paulo Renato Souza em seu artigo "Confusão na educação Básica", que trata do Fundef e do Fundeb e dos recursos aos três níveis de ensino.
 
Portanto, os municípios em geral recebem recursos do MEC para a educação infantil, mas são responsáveis também pelo período referente à gestação. Todavia, a assistência que oferecem está longe de atender as exigências dessa fase, já que as futuras mães são em geral de famílias de baixa renda, vivem na pobreza ou extrema pobreza e necessitam de um sistema que conte com uma estrutura composta de médicos de diferentes especialidades, enfermeiras, assistentes, equipamentos para os exames em geral, etc.
 
Além disso, receitas e orientações devem ser complementadas com o fornecimento de medicamentos e produtos alimentares àquelas cuja situação requeira esse atendimento adicional. E para as gestantes em geral não pode faltar um rigoroso acompanhamento e orientação para corrigir hábitos e impedir vícios prejudiciais à evolução embrionária e fetal. Evitar partos de crianças portadoras de limitações, incapacidades, defeitos ou doenças é a grande missão desse atendimento.
 
Voltando, então, à pergunta da Dra. Vanda Engel: Afinal, o que é priorizar a educação? Para responder a essa pergunta é necessário olhar para o quadro que atinge grande parte da população de baixa renda, em que o casal ou a mãe solteira tempouca ou nenhuma escolaridade. Ou que a família pode ser desestruturada e a mãe desconhece os cuidados que deve observar durante a gravidez, particularmente no que diz respeito aos vícios ligados ao tabagismo, álcool e drogas. Na melhor das hipóteses, não terão meios para prover uma saudável alimentação durante a gestação.
 
Visto sob esse prisma, infelizmente uma realidade existente neste País, a resposta à pergunta acima é dar assistência à mãe a partir da gestação, observando todos os cuidados para que a criança venha ao mundo sem que sua saúde mental e física tenha sido comprometida durante a gravidez. De que adianta a escola oferecer educação de qualidade a partir da creche se não for preservada a capacidade de aprender da criança?
 
Referindo-se ao Prêmio Nobel de 2000 D’Arienzo abordou a matéria ''Educação infantil carece de atenção", noticiando a presença no Rio de Janeiro de James Heckman, ganhador do prêmio Nobel de Economia desse ano, oferecendo a oportunidade de enriquecer o encerramento deste trabalho com comentários do principal convidado da homenagem organizada pela Sociedade Brasileira de Econometria (SDE) e pelo Ibmec para comemorar os 55 anos de Paes de Barros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), considerado o mais importante pesquisador brasileiro de política social. A seguir, reproduzimos os principais pontos da referida matéria:
  • Nos últimos anos, Heckman tornou-se um grande defensor dos programas de desenvolvimento infantil nos primeiros anos de vida, como a melhor ferramenta para corrigir desigualdades e promover o desenvolvimento social. Ele explica que, quando chegam à idade escolar aos 7 anos, as crianças oriundas de famílias carentes e de classe média já apresentam uma defasagem na capacidade de aprendizado que tende a se manter pelo resto da vida estudantil, com reflexos no futuro desempenho no mercado de trabalho ou na probabilidade de envolvimento com o crime.
  • Diversos programas americanos de apoio intensivo a crianças de famílias carentes, que tiveram posterior avaliação ao longo do tempo, mostram que esse tipo de intervenção pode ampliar a inteligência de forma definitiva apenas quando é feita até os 3 anos. Pode também influenciar as chamadas habilidades não cognitivas (perseverança, disciplina, motivação, capacidade de relacionamento) até fases mais tardias do desenvolvimento infantil.
  • Atualmente, Heckman vem dando grande ênfase às habilidades não cognitivas que, para ele, são decisivas no futuro desempenho escolar e profissional e também na redução da probabilidade de envolvimento com o crime. ''A metade da variação para melhor que vimos nas crianças que participaram do Percy Preschool Program (um dos mais famosos programas americanos de apoio intensivo a crianças de famílias carentes em idade pré-escolar) deveu-se ao desenvolvimento das habilidades sociais emocionais", disse.
  • No caso do Brasil, Heckman e Paes de Barros concordaram que um acompanhamento universal, que ensine pais de famílias carentes a cuidar melhor do desenvolvimento mental dos filhos, deveria ser o primeiro passo para a seleção de crianças a serem atendidas de forma mais focalizada por uma rede de creches de alto nível.
Em suma, James Heckman ensina e propõe:
 
Programas de desenvolvimento infantil nos primeiros anos de vida como a melhor ferramenta para corrigir desigualdades e promover o desenvolvimento social.
 
Que esse tipo de intervenção permite ampliar a inteligência de forma definitiva apenas quando é feita até os 3 anos, e que pode influenciar também as chamadas habilidades não cognitivas.
 
Que a universalização do acompanhamento das famílias carentes, ensinando-as a cuidar melhor do desenvolvimento mental dos filhos, deveria ser o primeiro passo para o atendimento das crianças por uma rede de creches de alto nível.
 
É a razão pela qual encerramos este trabalho repetindo que é de fundamental importância que ao direito de vaga na escola pública seja acrescentado o direito constitucional à educação infantil a partir da gestação.
 
Fonte: A Missão de Educar – Elzio D’Arienzo (pág. 19-24 e 146-148)- Editora Scortecci
 
Diante da clareza das idéias  expostas no livro de Elzio D’Arienzo, acrescentaríamos que as novas gerações estão vivendo o imediatismo do dia a dia, perdendo as esperanças de alcançar um futuro melhor. Em seu inconformismo e incompreensão diante da aspereza da realidade, a juventude não está recebendo estímulos enobrecedores e também não busca conexão com os valores da própria alma, caindo no marasmo e na inutilidade. Temos construído um mundo áspero e perturbador, que prima por enaltecer o imediatismo e que agora, nos limites críticos, começa a mostrar os efeitos indesejáveis das ações desprovidas de humanidade. Isso precisa ter um fim, pois a grande finalidade da vida humana é ser feliz buscando a evolução integral, ou seja, material e espiritual.
 
Necessitamos dar um novo rumo aos jovens. Além de aprender um ofício, praticar esportes e artes, é importante que recebam valores morais, éticos, respeito e consideração pelo semelhante e cuidados com o meio ambiente. Também deverão receber orientação sobre as questões ligadas à sexualidade responsável e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. A educação plena é a solução para um melhor futuro. É o principal instrumento para a construção de uma sociedade mais humana e pacífica e em permanente evolução.



Benedicto Ismael Camargo Dutra é graduado pela Faculdade de Economia e Administração da USP, faz parte do Conselho de Administração do Hotel Transamerica Berrini e é associado ao Rotary Club de São Paulo. É articulista colaborador de jornais e realiza palestras sobre temas ligados à qualidade de vida. É também coordenador dos sites www.vidaeaprendizado.com.br e www.library.com.br, e autor dos livros: “Nola – o manuscrito que abalou o mundo”;“2012...e depois?”;“Desenvolvimento Humano”; “O Homem Sábio e os Jovens” ,“A trajetória do ser humano na Terra – em busca da verdade e da felicidade”; e “O segredo de Darwin - Uma aventura em busca da origem da vida”(Madras Editora). E-mail: bicdutra@library.com.br; Twitter: @bidutra7
Comentários:


Joao Augusto Figueiro (figueiro@zeroaseis.org.br) comentou em 04/06/2014 - 08:06:33

Caro Benedicto:

Concordo integralmente com você e com o Heckman. Está de acordo com o que vimos propondo e realizando por meio do Instituto Zero a Seis, sendo esta a proposta básica do programa Mobilização Brasileira pela Primeira Infância.
Conte conosco nesta direção.
Figueiro.
www.zeroaseis.org.br


B. Dutra comentou em 16/04/2015 - 07:04:16

Torna-se imprescindível para os jovens de todas as idades, o contato com a sabedoria da natureza, suas belezas, sua lógica perfeita, desde a primeira infância, pois é na primeira infância que se formam as bases das conexões do cérebro. Nessas condições o desenvolvimento infantil tenderá a buscar o que seja realmente ser humano, facilitando o desenvolvimento de pessoas criativas e inovadoras diante dos desafios da vida.

José Duque (Duquef@outlook.com) comentou em 18/03/2019 - 17:03:29

Se a criança não for plenamente acompanhada em sua evolução material e espiritual, ensinando a ela as Leis que regem a Criação, como comportar-se, com iniciar o entendimento correto da existência, ela se marginaliza quando chegar a adolescência. Nossas públicas escolas e os professores que deturparam a educação, com suas políticas gremscinianas. A natureza é perfeita e não deve ser desviada, nem na educação básica infantil, pois as consequências desses atos são terríveis.

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