RSS
 

O PODER DOS ECONOMISTAS

Luiz Carlos Bresser-Pereira
03/01/2012



Não é uma teoria falsa por engano; o é por arrogância matemática que lhes dá monopólio sobre o saber

Desde os anos 1970 os dirigentes das instituições financeiras e os economistas viram seu poder político crescer, mas o mundo também viu um imenso aumento da instabilidade financeira.

Enquanto financistas ganhavam milhões e milhões, o prestígio e o poder dos economistas aumentava. Enquanto estes, muitos transformados em financistas, aumentavam seus ganhos, as crises financeiras se multiplicavam, e a renda de cada país se concentrava nos 2% mais ricos.

Podemos buscar várias explicações para isso, mas creio que o fato histórico novo que teve papel determinante nessa mudança foi a decisão do presidente Nixon em 1971 de suspender a conversão do dólar em ouro ou, mais especificamente, a conversão das reservas em dólares dos outros países em ouro, se seus dirigentes o solicitassem.

A partir desse momento, o dinheiro perdeu referência com a economia real; a criação, o fluxo e a destruição de moeda passaram a ocorrer com grande facilidade; o endividamento do setor privado saiu de controle e, na falta de uma verdadeira âncora para a economia, as crises financeiras se tornaram, além de mais frequentes, também mais profundas.

O poder dos financistas e dos economistas aumentou porque eles passaram a ter um papel estratégico: seriam os gestores desse novo quadro monetário-financeiro – da "financeirização" da economia mundial. Mas, passados 40 anos, verificamos que fracassaram.

Os financistas, porque se preocuparam apenas em ganhar mais dinheiro para eles e para os rentistas. Os economistas, porque construíram uma teoria matemática – a teoria econômica neoclássica – que "demonstrava" que os mercados eram autorregulados, de forma que não havia por que gerir as economias nacionais e a economia mundial. Os dois, porque, ao desregularem os mercados financeiros, estavam "desgerindo" a economia.

Dani Rodrik informou em artigo recente (publicado no "Valor", 19.dez.2011) que um grupo de estudantes abandonou o curso de seu colega na Harvard University Greg Mankiw, protestando contra o fato de que "o curso propaga ideologia conservadora disfarçada de ciência econômica e ajuda a perpetuar a desigualdade social".

Os alunos foram benignos com a teoria econômica ortodoxa: deviam ter acrescentado que ajuda também a aumentar a instabilidade financeira e causar baixo crescimento.

Rodrik defendeu o colega, argumentando com o seu "paradoxo da globalização": que nos cursos os economistas neoclássicos ensinam uma teoria econômica sofisticada, onde as falhas de mercado são devidamente salientadas mas, na hora de proporem políticas, adotam um liberalismo econômico simplista. Ele está enganado.

Essa teoria econômica matemática que se ensina nas grandes universidades, baseada nos pressupostos do "homo economicus" e das expectativas racionais e no modelo do equilíbrio geral é essencialmente falsa, porque usa o método hipotético-dedutivo e porque adota como critério de verdade a coerência lógica, não a conformidade com a realidade.

Mas não é uma teoria falsa por engano; o é por arrogância matemática que lhes dá monopólio sobre o saber e porque interessa aos economistas ensinar que os sistemas econômicos são autorregulados, bastando para isso corrigir suas pequenas falhas.

Dessa forma eles usam a teoria econômica neoclássica para justificar "cientificamente" o neoliberalismo – uma ideologia reacionária que durante 30 anos (1979-2008) promoveu o atraso e a desigualdade em todos os países que a aceitaram. E, ao mesmo tempo, dizem aos cidadãos desses países que fiquem calados, já que não dominam o "conhecimento" matemático e preciso.

Publicado na FSP em 02/01/2012

Fonte: Conteúdo Livre

Comentário de Vidaeaprendizado

A ânsia pelo poder e a luta para dominação levaram o homem a desenvolver teorias de conformidade com seus interesses. Num passado não muito distante o domínio da religião na vida dos seres humanos impunha conceitos dogmáticos, antinaturais. Não diferentemente se deu com a Ascensão do dinheiro que passou a ser o grande ídolo da humanidade. O poder foi transferido para as mãos dos seus detentores que se tornaram donos dos saberes, eliminando tudo que não lhes fosse conveniente. Todos os belos discursos sobre a civilização e a dignidade humanos foram pisoteados, para que o dinheiro assumisse a  finalidade prioritária da vida. E deu no que deu, iniciamos o ano com muitas sombras, todas elas produzidas pelo “homo economicus”, em sua estúpida mania de grandeza que desconsidera a transitoriedade da vida. O grande risco é que tenhamos a paz em retrocesso.



Comentários:


Fernando comentou em 04/01/2012 - 13:01:45

Uma forte regulamentacao precisa ser implantada imediatamente disciplinando o mercado internacional das bolsas de valores, eliminando, por exemplo, a especulacao de moedas e commodities do mercado futuro. A vontade politica necessaria pode vir da ocorrencia do caos economico que atualmente espreita muitas nacoes.

Tal regulamentacao ja existia, por exemplo, nos USA, mas foi relaxada ou totalmente eliminada por pressao desta nova casta, qualificada pelo autor como arautos de uma teoria falsa que foi implementada por ambicao e arrogância matemática.

O mundo economico caminha celeremente para uma desintegracao economica geral caso nao seja alcancado um acordo internacional justo que altere as regras atuais.


Os comentários não representam a opinião do site Vidaeaprendizado, a responsabilidade é do autor da mensagem.
Enviar um Comentário:

Nome:
Email:
  Publicar meu email
Comentário:
Digite o texto que
aparece na imagem:

Vida e Aprendizado 2011.
Reproduçao total ou parcial do conteúdo deste site deverá mencionar a fonte.